sexta-feira, 11 de novembro de 2011

DISCURSO MUDO

Um bater brusco de porta anunciara o acontecimento. As palavras repercutiam-se na minha cabeça, desorientando-me os pensamentos.
Convocaram-se as partes, apresentaram-se os factos e as descrições do acontecimento. Já passava das nove e meia.
Dirigi-me ao carro. Seguia o ruído de um motor acelerado, quando um corpo mudo e submisso embateu no meu pára-brisas.
Envelhecido nos cascos, o caso, dava luz aos espíritos e fazia acordar a voz paradoxal da ciência dos homens.
Coloquei o pé na ferida e travei com violência. Com os olhos no espelho retrovisor revisitei avenidas, ruas, bairros que hoje envergam as vestes do meu outro ser. Atravessei tufões, mares, e numa braçada regressei.  
Entorpecido por um Deus oculto ou malévolo, o homem, sentado no banco, respirava paulatinamente a sua culpa.
Analisadas as provas, lidos os autos, a sala, inundada por um estranho silêncio, projectava um corpo no eu da minha existência.    Um ecrã de vidro jorrava o sangue nas minhas pupilas e não. Não era uma dicotomia.
O outro, vestido de negro da cabeça aos pés, enfatizava.
Os ânimos exaltavam os discursos e o calor proveniente dos corpos sublinhava o cheiro asfixiante da sala.
De novo em marcha, seguia a minha voz. A voz, afinal já não era minha. A voz do ócio ou a voz ladina, vestida de negro.
De alguém que escreveu “… a bruta fereza do nosso sangue animal… espera por nós… emboscado nas encruzilhadas… escarnece de nós e destrói-nos…
Ou a voz do homem.
… em determinadas e raras circunstâncias conduz-nos… depois da destruição… até uma paz incompreensível.”
Ou a voz do discurso, de um corpo que era o dela.

4 comentários:

Olga disse...

Gosto muito.

cecilia barreira disse...

É uma estreia boa . Que continue assim.

Diogo Godinho disse...

Deixas-me a bem avizinhar o que daí virá.

Anónimo disse...

overwhelmed :O