Há coisas que parecem mais antigas do que o arco-da-velha. E ninguém percebe, vá se lá saber porquê. Eu mesmo, Odete de nome, não entendo o que o sr. Baptista faz ali parado nas escadas. Juro que não entendo, dá para eu ir estender a roupa, ligar para as minhas filhas, mandar um e-mail aos meu netos na Suíça, ver as notícias no primeiro canal, enfim, até dá para ir à bica e voltar. E pronto, o homem vai lá estar de certeza, ainda a descer as escadas. Com sorte, já estará no último degrau, já só lhe faltará um passo e a descida acaba-se. Coitado, eu não devia dizer estas coisas, diabos me mordam. Vou à bica.
O Baptista vai estar à espera do filho. Por sua vez, o filho vai chegar, vai levá-lo, vai acenar-lhe e o Baptista vai-se embora. Isto se o filho do Baptista não sair do carro. Caso contrário, o filho do Baptista vai sair do carro, vai trazer um andarilho, vai agarrar o pai e depois ainda vir-me-á bater à porta a dizer as boas tardes.
Bem, eu de facto, como dizia, entretanto fui ao café, voltei, cheguei ao prédio e o homem ainda lá estava. A blusa verde de todos os dias, o mesmo cheiro a tabaco tresandando pelo prédio. Olha-me, pára, e nós conversa de escadas — Bom dia dona Odete – Boa tarde sr. Baptista. E eu sigo. Coitado do homem que está sempre metido em casa e não vê ninguém. Tem a mulher de cama já vai para cinco meses. Tem a cara abatida. O filho chega, não sai do carro. Lentamente, o sr. Baptista vai dar o seu passeio de todos os dias.
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domingo, 27 de novembro de 2011
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3 comentários:
Diogo gosto tanto da tua escrita. O texto é enternecedor.
este conto é ótimo. parabéns.
Muito obrigado. Gosto sempre de explorar contextos que nunca ninguém imagina.
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